Pra todos os meus 23 eus, tivemos um ano muito intenso. Enquanto achava que sabia tudo sobre morar fora do país (afinal, já são 5 anos só) descobri que não tinha a mínima ideia de como é realmente viver a vida adulta. Isso é um texto para lembrar a mim e a quem estiver lendo isso que, apesar da vida ser um investimento, principalmente um investimento de tempo, talvez as coisas não acontecem no tempo que a gente quer porque talvez aquele não é o tempo certo para nós naquele momento. E tudo bem. Afinal, somos nós que traçamos a nossa rota (e principalmente o nosso estado final de chegada).
Em dezembro, rasguei as minhas metas para 2024 na hora em que terminei de fazer. Pela primeira vez, decidi fazer um pouco diferente:
1. Ouvir os prazos e pedidos do meu corpo sem neglicenciar.
2. Reconhecer o medo como um velho amigo. Oferecer-lhe uma xícara de café ou uma dose extra de sono.
3. Ser gentil com todos os meus 23 eus (e todos aqueles que ainda estão por vir).
4. Sentir a presença de tudo, sem necessariamente sentir a necessidade de consumir tudo.
5. Estamos todos tentando respirar. Uma deadline só se faz sentido se vier a ser uma bornline.
6. Reconhecer minhas vitórias presentes.
AGORIDADE
um corpo na cama
uma poesia no tempo
um estado na memória
significam a mesma coisa
um poeta corta a mão que escreve
a caneta treme, a palavra muda
gagueja
se arrasta
um poeta reforma a mão compra um
suporta ao lápis toma a
paciência como língua tira do
papel aquilo que a memória
sufoca
o lápis foge do corpo sem antes rasgar o
papel
o poeta vê esse acontecimento um
objeto de estudo. muda.
o poeta rabisca o papel com a unha até marcar a mesa
um ato mecânico
o corpo do poeta e
o corpo da mesa
se unem pelo estatuto papel.
há uma agoridade que redefine o corpo.
(porto, jan/ 24. Julia Peccini)
Obs: Referência do ultimo verso em Pires, 2004, p.63.
E para você que leu até aqui, muito obrigada! Te espero para o poema-potência-ato seguinte, no #frestas 14!
Meu nome é Julia Peccini (@julia_peccini), tenho 23 anos, sou mulher, poeta e imigrante Semifinalista do Prêmio Oceanos 2023. Nascida e criada em Niterói, no Rio de Janeiro, vivo e resisto em Portugal desde 2018. Meus livros Nem só de amor vive Afrodite e Mergulhar na Pele, Desoxidar a Língua, estão disponíveis para compra e te convido a dialogar comigo um pouco sobre essas frestas que nos despontam.
"um poeta reforma a mão"... linda poesia, Julia!!!